quinta-feira, 23 de agosto de 2007

joelhos

E os olhares se cruzaram, se cruzavam, se cruzaram mais uma vez. Cruzei as pernas incomodada, para descruzá-las e cruzá-las novamente. Me surpreendi ao perceber que ele não mais disfarçava. Não olhava pro canapé de salmão para depois olhar pra mim. Passou, de súbito, a me observar. Antes apenas os olhos, o meu incômodo. Depois as pernas, aflitas, o contorno, o caminho entre elas. Meu incômodo cresceu, tentei esticar o vestido para que pudesse cobrir os joelhos, mas era impossível. Meus joelhos lhe pertenciam. Olhei em volta, procurando alguém, algo que me distraísse, que servisse como desculpa para sair dali. Resolvi me virar, para lhe esconder o meio das pernas, para cobrir meus joelhos com a toalha de algodão branco. Alguns segundos se passaram, mas ainda estava inquieta. Queria olhar pra ele pra ver se ainda me observava, mas se me virasse talvez desse uma impressão errada. Impressão errada? Qual seria a impressão certa? Não agüentei, como nunca agüento. Virei. Ele me olhava. Tornei os olhos pra frente e, involuntariamente, apertei uma perna contra a outra, várias vezes. As duas senhoras que estavam na mesma mesa que eu se levantaram. Estremeci. Ainda voltei meu corpo, o braço esticado, para impedi-las. Não pude. Elas se foram. Fechei os olhos por alguns segundos. Quando abri, ele estava ali, diante de mim, com um meio sorriso nos lábios rosados. Aquela sensação, aquela que eu estava prendendo em algum lugar do meu corpo, que eu escondera da minha consciência, invadiu o espaço, escancarou-se. Estava excitada. Os joelhos dele estavam próximos dos meus. Eu sabia que estavam perigosamente próximos, embora não os visse. Engoli em seco, ainda apertando as pernas uma contra a outra, agora consciente do que fazia. Ele sorriu aquele sorriso raro, maroto, e sua mão procurou a minha. Tirei a mão da superfície da mesa e a trouxe junto ao corpo, como se tivesse me queimado. Ele recuou lentamente, olhando em volta. Com um movimento mínimo, eliminou a distância que separava seu joelho esquerdo do meu joelho direito e, aí sim, estremeci, para em seguida relaxar meu corpo, antes tenso. Não tentei me afastar e, resignada, deixei que ele raspasse seu joelho no meu, sem me preocupar o quão suspeita seria aquela cena para os que observavam. Fechei os olhos e estiquei um pouco a perna, sentindo o tecido fino de sua calça na minha perna nua e lisa. Ele então procurou a minha mão esquerda, que repousava sobre a perna. Não me afastei, por não ter visto seu movimento e por não querer me afastar dele. Abri os olhos ao sentir o toque, ele estava em pé. “Uma dança?”. Minha perdição. Aquela voz rouca, mal humorada. Fosse mudo, eu teria salvação. Mas não. Falava pouco, mas sempre a coisa certa. Levantei-me, embriagada, esquecida dos perigos, sorri dissimulada para um senhor de idade.

Meus joelhos lhe pertenciam.

domingo, 12 de agosto de 2007

sejamos sinceros.
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pra que plural?
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mas pensando bem, até que faz sentido. Se alguém ler isso, já seremos dois e, portanto, mereceremos um s ao final de cada palavra. Se não for lida, tudo bem também, porque não poderei ser corrigida. Odeio ser corrigida.

Sejamos sinceros, para não sermos violentos. O último post foi, como os anteriores, bem down. Não sei se deveria usar uma palavra inglesa mas, que diabos! (elas nunca vêm sozinhas). Enfim, cabe bem aqui. Os posts estão demasiado intimistas e tristes. Se fossem bem escritos ao menos, mas não são.
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gostei dessa história de pontinho. para quem não entendeu, eles significam: "estou pensando no que escrever"
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queria escrever algo alegre, animado, pra cima (up aqui não dá). Mas acho que descobri (mais uma) limitação.

não que esteja triste.
só preocupada mesmo.
e sensível, como os tempos de tpm devem ser.
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já que meu intento não é realizável, resta-me dizer:

Vida Nova, Café Novo. e de todos os tipos e de graça.
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escrever é vaidade. vaidade pura, agora eu sei.


Tenho essa consciência que me cutuca, que vive a gritar “mas você vai ser feliz assim?” ou “você não tem vergonha?”. E aí eu respondo, cabisbaixa: “morro de vergonha”. Morro de vergonha de ter envelhecido, de ter achado que poderia perder a força quando, na verdade, nunca tive essa força, essa convicção que alardeei por aí. Burguesa eu sou. E daquelas fingidas, o que é pior.